18 de outubro de 2011

Mensagem a um grande amigo

Me lembro bem das palavras que saíram de minha boca no dia em que fui convidado por um grande amigo a dividir um apartamento em outro lugar.

Seu pai havia comprado um apartamento muito bonito e confortável em uma região privilegiada de São Paulo para seu filho que, na época, fazia faculdade e morava comigo em um apartamento pequeno e apertado.

Lembro da condição imposta por meu amigo para que a mudança ocorresse: “disse a meu pai que eu só vou se você for.”

Hoje e sempre, e pra quando for preciso lembrar desta ocasião, fiquei muito feliz em receber essa proposta de dividir outro apartamento com esta pessoa que sempre me foi muito próxima.

Desde pequenos dividimos histórias, desafios, o imaginário repentinamente tornou-se surreal e, ao lidar com os fatos, vivemos sonhos como realidade enquanto outros mal sabiam que existia outra realidade além de suas aulas em um colégio de freiras.

Fomos irmãos nascidos em famílias diferentes, estivemos unidos quando a história nos separou em distancia, e nos unimos novamente quando decidimos dividir um pequeno apartamento.

Mas naquele dia em que a noticia da compra de um lindíssimo apartamento em um condomínio de classe média alta chegou a nosso conhecimento, sabíamos que seria o ultimo capitulo de um volume.

De alguma forma impossível de explicar, por mais que coisas boas ainda acontecessem, eu sabia, seria o fim.

Fizemos a mudança, foi um sucesso, levamos todas as coisas de uma vez só em um caminhão caindo aos pedaços, cuja porta do passageiro (onde eu me encontrava) não fechava de forma alguma e o cinto de segurança não existia.

Montamos o apartamento com as poucas coisas que tinhamos, e mesmo com o pouco, era o suficiente para nos sentirmos confortáveis por muito tempo.

Nos divertimos, bebemos em memoria a muitas coisas, bebemos em comemoração a muitas coisas, ficamos sem agua quente, sem geladeira, se luz, sem cerveja, sem absolutamente nada, e mesmo assim estávamos bem.

Vivemos e isso foi muito bom.

Demos inicio a novos projetos, conhecemos novas pessoas, novos lugares, outros mundos, formamos uma nova família baseada em um conceito de irmandade e cumplicidade que muitos julgariam, e o próprio julgar foi quem, no fim acabou com tudo. Mas sou obrigado a dizer, nós já sabíamos que algo ia acontecer, não é verdade?

Pessoas se uniram a nós repentinamente, algumas se despediram de nossas vidas, aquelas que sempre acreditamos que nunca iriam voltar acabaram por se juntar a nós quando menos esperávamos e outras vieram na torrente de paz que vinha da convivência que nós criamos.

Não tenho medo de dar nomes...

Erika, aquela que voltou após muito tempo e a menina na qual temos muito orgulho por seus feitos e por sua energia.

Flavia, a menina decidida, doce, da rebeldia que encanta por ter toda a paz que nunca tivemos e que fez parte de nossa família e nos ensinou muita coisa.

Jack, que nós cuidamos sempre, por carinho e amor e que hoje está lá firme e forte!

Rafael, o viking que nos acompanhou nas jogatinas e discussões, nas bebidas e nas curtições.

Thomas, o boemio, de ideias maravilhosas, discussões filosóficas e noitadas de boa musica e cerveja.

Felipe Munhoz, parceiro filosófico e sempre com um bom gosto musical muito a frente de nossas expectativas.

Karen, de repente se uniu a nossa família, se mostrou parte dela a muito tempo e hoje é minha amada esposa.

Existem outras pessoas a acrescentar nessa lista, muitas outras pessoas se pararmos para pensar, mas numera las nunca foi nossa vontade, mas sim ama-las, estar presente em todos os momentos, viver ao lado delas plenamente.

Quanto a mim, não sei, só você pode dizer o que pensa sobre o assunto, e de certa forma já sei o que você vai dizer, ainda que me faça chorar, seja com suas palavras ou com seu silencio.

Meu irmão, meu parceiro, não o culpo, nunca terei motivo para isso e sequer passa em minha cabeça tentar encontrar motivo para tal. Sabíamos desde o inicio que existiria um fim e que o mesmo permanecia fora de nosso controle.

Porem me recordo que os que hoje se encontram próximos a nós, um dia se recusaram, se fecharam, preferiram a reclusão em suas vidas ao invés de escutar a verdade que gritava em seus ouvidos, e hoje só eles sabem o que viveram e o que foi preciso fazer para chegar até aqui.

Você, meu irmão, foi o único que sempre se manteve forte, mas chegou seu tempo de reclusão, e que ele dure o quanto você achar que é necessário, mesmo que seja para toda vida, mesmo que você acredite que sua reclusão seja sua salvação, ou o que for. Só você sabe o que quer viver e o que quer fazer.

Não sou do tipo que vai chutar a sua porta insistentemente, que vai atropelar a sua vontade para impor a minha opinião, por isso nada fiz no dia em que o fim chegou.

Porém todos os dias, todos eles, penso no grande irmão que tenho e como seria bom dividir algo que vivi ou experimentei, como seria interessante estar a seu lado para conversar, discutir, filosofar ou apenas ficar em silencio.

De volta ao mesmo prédio em que moramos antes da mudança, no mesmo andar, em um apartamento logo ao lado sinto a mesma sensação que tive a muito tempo atrás, como se me colocasse como um fantasma naquela sala no mesmo dia em que resolvemos nos mudar.

Indiferente ao que lamentavelmente aconteceu, aos desencontros que tivemos antes do fim, as conversas que prometemos ter e que nunca tivemos por vários motivos, indiferente a qualquer acontecimento fora de nosso controle, estamos bem, estamos vivos.

Eu casei com a Karen, estamos felizes, moramos em um apartamento pequeno mas imensamente confortável. Temos planos de ter uma filha, de comprar um apartamento melhor e tomar cervejas diferentes. Mudei de emprego, ela saiu daquele em que estava e está lutando por seu sonho de ser arte finalista.

Em todas essas mudanças pelas quais passamos, você fez e faz muita falta meu irmão, e sempre fará.

Iremos nos encontrar no futuro, e você sabe disso tanto quanto eu, seja no mundo real, seja em nossos sonhos.

Cada um teve seu tempo. Esse é o seu.