28 de março de 2008

Isto está começando a doer de verdade (parte 3)

Puxou a pequena caixa metálica do bolso e abriu com um leve balanço dos dedos. Com outro movimento afastou o fino papel e recolheu uma das pequenas balas brancas, mentoladas, suas favoritas.
Pondo na boca, parou um segundo até sentir o sabor doce se espalhar pela língua. Agora era a hora para o segundo movimento.
Sacou de outro bolso o pacote de cigarros, finos, suaves e logo acendeu um. Puxou ar com os pulmões forçando a primeira tragada, para que o cigarro iniciasse sua destruição.
Malditos, pensou ele, pois colocam açúcar na ponta para que se tenha a sensação de doçura ao se matar. Mas não era assim o leve sabor da morte? Tão doce, suave, sereno? Sim, era assim que tinha de ser, e uma hora isso iria doer de verdade.
Então o processo estava finalizado. Ouvia o queimar do papel, seus leves estalidos a cada puxada de fumaça para dentro dos pulmões. E como se não bastasse a doçura do cigarro, a doçura da pequena bala que pretejava e diminuía, a tontura provocada a cada trago, vinha a certeza de estar sozinho, ou pelo menos o bastante para se deliciar com sua decadência.

27 de março de 2008

Isto está começando a doer de verdade (parte 2)


Do outro lado da cidade, um garoto, pouca idade, cerveja esquentando na mesa, uma porção de provolone embebida em azeite e uma pitada de sal para dar algum sabor.
O mundo girava, e ele sabia disso, por mais que sua cabeça cheia de álcool tentasse transformar sua percepção da realidade em algo totalmente surreal.
Era uma vaca vermelha com bolinhas azuis atravessando a escuridão? Não... certamente que não.
Sozinho, como sempre, e preso naquela cadeira que cismava em atraí-lo toda quarta-feira de folga, para que observasse calmamente o movimento das prostitutas rua acima, chamando táxis para mais uma festa particular. Para os que pagavam, é claro.
Mas o que o incomodava era o fato de estar preso naquela cadeira, de não se mover, de saber que tinha muito mais capacidade para mudar seu próprio destino do que fingia saber.
A grande realidade era que talvez ele quisesse se manter preso a aquela realidade mórbida de trabalhar para seu próprio sustento, sem ter interesse em qualquer outro assunto que não fosse trabalho. Vivia para trabalhar e trabalhava para viver. Estava bom assim.
Por quanto tempo?
Por quanto tempo aquela cerveja gelada o manteria preso ao calor da cadeira, sem que ele tomasse conta da realidade do mundo e de sua própria vida?
Por quanto tempo toda aquela situação iria amortecer o peso que carregava em suas costas e que um dia o faria sofrer?

26 de março de 2008

Série - Isto está começando a doer de verdade

A Algum tempo venho escrevendo uma série de contos, todos eles diferentes uns dos outros, mas com o mesmo tema, a dor.

É quase como uma segunda verdade incontestável, pois assim como um dia a morte virá, um dia sentiremos dor, de alguma forma, e o que é mais engraçado é que da mesma forma iremos um dia causar dor a outras pessoas, como uma reação.

Então, sem mais delongas, ai vai o primeiro dos textos. Enjoy!

.........................................................................................................................................................................

- Isto está começando a doer de verdade
Já faziam algumas boas horas e ele continuava ali, jogado no canto mais escuro e úmido do pequeno quarto, sua cela particular, como seus seqüestradores disseram no momento em que retiraram a venda que cobria seus olhos.
Seus pulsos estavam presos por um par de algemas impiedosas, que rasgavam sua carne a qualquer principio de movimentação que ele ousasse iniciar. As costas estavam arqueadas para a frente, como quem tenta cheirar o chão em que está jogado, como um corcunda, direto dos filmes de holywood, apresentados sob a fina escuridão de uma caverna abaixo de Notredame.

"Existe mais coisas entre o céu e a terra..."

A pelo menos uns cinco anos atrás, dei inicio a uma espécie de blog onde eu escreveria meus textos, apresentaria ideias, contaria o que meus olhos vissem de interessante, enfim, um lugar onde as ideias iriam fluir tranquilamente, para onde eu iria caso precisasse de esconderijo, então criei o Vortex.

Eis que ele era minha valvula de escape, um baú para frustrações e outros sentimentos que me atacavam em série naqueles tempos dificeis.

Mas algo aconteceu.

"Ele ganhou dinheiro/Ele assinou contratos/E comprou um terno/Trocou o carro/E desaprendeu a caminhar no céu/E foi o principio do fim"*

E foi assim que, por um infortunio, o vortex caiu no vortex! É claro que outros fatores, como a falta de internet disponivel todos os dias ao acance de minhas mãos, foi decisivo, mas a verdade incontestavel é que eu havia desistido desse movimento filosófico ao qual iniciei naquela época.

Agora, muito tempo após pausar minhas atividades cerebrais, resolvi voltar e trazer o vortex de volta a realidade.

Um motivo para isso tudo? Varios!

-Liberdade, Igualdade, Fraternidade! (1º deles)
-O que existe por detrás das sombras na caverna de Platão? (2º)
-Se eu não viver minha vida agora, quem viverá ela por mim?(3º)
-Tostines é fresquinho porque é mais gostoso, ou gostoso porque é mais fresquinho?(4º)

Sabe, eu brinco, mas as mudanças que ocorreram realmente me trouxeram de volta pra vida. Eu precisava disso, e o Vortex também!

Portanto, sejam bem vindos ao Vortex!